sábado, 12 de janeiro de 2008

UMA AFIRMAÇÃO QUE NESTE BLOG PROCURAMOS CONTRARIAR...

"O homem é mais propenso a contentar-se com as ideias dos outros, do que a reflectir e a raciocinar."

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

NÃO DEIXES PARA AMANHÃ…


CRUZ, Paula - Enfermeira na Unidade de Cuidados Paliativos da Casa de Saúde da Idanha

"Março de 2006…

Depois de, durante 1 ano, um grupo de enfermeiros e outros técnicos, em equipa, se terem preparado para cuidar de doentes em cuidados paliativos, no dia 6 de Março iniciamos a nossa caminhada,
todos muito conscientes do desafio que era,
iríamos ter connosco pessoas a morrer
e que tinham direito a que lhe proporcionássemos uma morte digna.

O que é que nos esperava?
Será que íamos conseguir?

A intensidade com que vivemos cada minuto do primeiro dia, era tal, que para nós era como se estivéssemos a viver o primeiro dia do resto das nossas vidas.
A partir daquele dia uma parte de nós tinha a grande responsabilidade
de receber a pessoa na maioria das vezes para morrer
e de transformar esses últimos dias de vida
nos primeiros com direito obrigatório
a uma assistência digna para uma morte tranquila.

Depois de todas as hipóteses curativas serem esgotadas
Eis que chegam até nós…

Cansados do sofrimento
Esgotados por não conseguirem ser donos dos seus dias
Fartos de não poderem fugirem da impotência dos médicos

Assustados por não saberem afinal quantos dias lhes restam
Mas com a certeza de serem muito poucos
Horrorizados por pensarem naquela dor que os acompanha
desde que lhe disseram
Você vai morrer de cancro…
Completamente perdidos no meio de um pântano sem cordas
Pois a sua família vai ficar sem hipóteses de sobrevivência

Habituados a paredes brancas
As enfermarias de 6 camas
As pessoas a gemerem sozinhas na cama ao lado
A terem as suas famílias do lado de lá do corta-vento
Á correria dos profissionais que não têm tempo de parar
Para lhe fazer companhia
Para os ouvir
Para lhe dar a mão

E aqui estamos nós…
Prontos a cuidar destes doentes

O que é que vamos fazer?
Aliviar-lhe o sofrimento:

Para a dor damos o analgésico
Para a agitação a sedação
Para o vómito o antihemético
Para a dor d`alma damos a mão

Claro que sabemos que a maioria destas pessoas
Vão morrer connosco
Claro que sabemos que não podemos
Fazer parar o percurso da doença
Mas também sabemos que a qualidade de cuidados
Que temos para lhes oferecer
Transpõe toda e qualquer perspectiva da cura

Com a D. L..... a D. F...... e respectivas famílias, iniciamos a nossa caminhada.
Seres humanos desesperados,
Com histórias de vida carregadas de recordações.
Sofrimento estampado nas caras.
Pedidos de socorro, conscientes que não teriam resposta por estarem a morrer.
Famílias perdidas, histórias por resolver, sentimentos por partilhar.
Medo do desconhecido, certezas de estarem a terminar.

E nós?
Profissionais de saúde com a prática de curar.

E agora, o que é que nos era pedido?
Por favor tirem-me as dores!
Por favor não quero vomitar mais!
Por favor, ela está com falta de ar!
Por favor tirem-me este sofrimento!

E nos olhares perdidos dos familiares, pedidos de socorro...
Por favor não a deixem morrer ainda!
Por favor, eu quero-lhe dizer que…!
Por favor salvem-na!
E nós?
Nós vamos tirar-lhe as dores.
Nós vamos parar-lhe os vómitos.
Nós vamos tratar-lhe dos sintomas que lhe causam sofrimento.
Mas também estamos aqui para os ajudar a unir as mãos mesmo em silêncio.
Diga-lhe tudo o que ainda não teve oportunidade de dizer…
Diga-lhe que perdoa…
Diga-lhe que a ama…
E nós…!
Para além de cuidadores…somos seres humanos!
A receber pessoas para, passadas poucas horas nos despedirmos…
A receber pessoas que nos fazem reviver alguma dor mal curada…

A receber pessoas que vamos palear, que nos enchem o coração e que quando partem nos deixam a chorar…

Os dias foram passando…algumas duvidas foram ficando…
Afinal não somos os donos da verdade.
Estamos no inicio da construção de um forte,
em que cada pedra usada
é uma descoberta fundamentada,
E que quando assente no chão
já passou pela reflexão de quem está consciente do que quer,
de quem está a fazer tudo para que esta obra embora ainda por muitos anos inacabada, seja digna de crescer com bases humildes e verdadeiras, sem perder de vista a grande missão a que nos propomos.

Como é que os doentes que partiram sentiram a sua morte, só os próprios saberão…
Se conseguimos…não sabemos…
Mas que sofremos…também sofremos…

As famílias…estão connosco.
Fizeram parte do nosso plano de cuidados, fizeram parte da nossa equipa prestadora de cuidados, e ficaram a fazer parte da família da nossa unidade.

Vêem em nós, neste momento tão especial das suas vidas, aqueles que estão imunes de juízo de valores, aqueles que estão aqui para ajudar, para ouvir, para esclarecer…
e para, no momento da partida, dar a mão se eles não chegarem a tempo.

Somos ainda muito bebés, somos ainda muito pequeninos, com um longo caminho pela frente…mas já recebemos tanto em troca do pouco que fizemos…

É um sorriso… de quem entrou a dizer “vou para os terminais”!
É ouvirmos “obrigada por me dar tanto carinho
“ não sabia que seria possível existir um sitio em que ainda nos tratam assim

É, no casal em que a esposa está a morrer, o marido querer-lhe satisfazer o grande desejo de casar pela igreja, querer faze-lo aqui e fazer questão que uma de nós os apadrinhasse…não conseguimos dar-lhe esse sacramento…ela não resistiu ao tempo, mas ele passou a tratar a enfermeira por madrinha de um anjo…

É, o marido de uma doente dizer para uma criança, filha de outro doente, “sabes minha querida, no céu existem os anjinhos que tem asas brancas, cá na terra existem estas senhoras vestidas de branco”…

É satisfazer-lhes os últimos desejos
E aqui estamos nós
Prontos a cuidar e a ser cuidados

Aqui passámos a viver a nossa vida de uma forma diferente
Quem aprende a viver a morte aprende a viver melhor
Cada minuto tem a intensidade de uma vida inteira

Ouvimos com outros ouvidos
Vemos com outros olhos

Podemos ter um longo caminho para percorrer na descoberta dos cuidados paliativos, e durante muito tempo termos que validar quase tudo o que fazemos uma centena de vezes, mas parece-me que dentro do nosso peito já mora a missão da nossa unidade…
"


Este texto foi apresentado pela Enfermeira Paula Cruz da Unidade de Cuidados Paliativos da Casa de Saúde da Idanha durante uma aula de formação em contextos de trabalho no decurso do VIII CCFE da ESEL polo Maria Fernanda Resende. É para mim um prazer poder publicar neste espaço virtual uma experiência tão particular, que para tantas reflexões nos transporta.

O meu muito obrigado Paula por partilhares,também aqui neste blog, connosco algo de tão profundo, inovador e intimista.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

RESISTIR À MUDANÇA !

"....O problema deles é precisarem de desaprender umas quantas coisas, o que é difícil, quando esssas coisas tinham sido tão bem aprendidas! (...)
Precisam de ser capazes de ver a realidade da nova situação em que se encontram, e não da realidade tal como ela costumava ser."
REDDIN, B 1990

DIÁRIOS DE APRENDIZAGEM – PROMOÇÃO DA REFLEXÃO NA PRÁTICA CLÍNICA


PEREIRA, Esperança Gago Alves

Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem de Calouste Gulbenkian (ESECG) (Braga), Enfermeira especialista em reabilitação, Pós-graduada em Ciências da Educação pela Universidade de Aveiro e Mestre em Ciências de Enfermagem pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Este artigo é um resumo do trabalho de investigação da autora no referido mestrado.

A autora descreve-nos um estudo realizado com alunos do curso de bacharelato em Enfermagem da ESECG sobre a importância dos diários de aprendizagem para o processo formativo ou se quisermos reflexivo. Sobre os detalhes do estudo vou-me escusar a referir a metodologia seguida, abordando neste pequeno texto, como será natural, mais as questões expositivas e criticas dos seus princípios e resultados.

Poderia resumir o artigo ao próprio resumo da autora “ Constatamos que os diários de aprendizagem motivam o esclarecimento de ideias ou acontecimentos confusamente experienciados, já que a escrita funciona como mediador da reflexão da acção. Bem como nos sugere que as experiências significativas, surgem a partir da observação e consciencialização das acções através da reflexão e ao promover a reflexão através da experiência, também favorece a articulação entre teoria e prática”pág. 12.

De imediato me apetece parar de ler e exclamar está tudo dito.

Conjugando saberes de textos anteriores, parece-me claro. Durante o percurso formativo existem espaços teóricos e práticos, é em espaços da prática, da acção, que melhor podemos reflectir sobre algo. E este algo não é nada em abstracto, mas sim aquilo que nos marca de uma qualquer forma, que nos marca durante a essência da nossa profissão – CUIDAR. Mas afirmarei, que nos marca pessoal e profissionalmente, que nos marca quando cuidamos um doente, ou quando observamos a prática de um já “Sr. Enfermeiro”, da postura de uma equipa, da delegação de competências noutros profissionais, etc, etc. E então a melhor forma para esclarecermos o vivenciado começa por ser escrevendo-o. Como já vimos a escrita confronta-nos connosco próprios, e é neste sentido que surgem os diários de aprendizagem como forma de confronto, de uma exteriorização de dúvidas despodoradas. Mas este é um diário algo diferente daquele que na adolescência ficava guardado e trancado com uma chave. Após o momento que os escrevemos foi porque tomamos consciência de algo, processo de “conscientização” já referido por Paulo Freire, a partir daqui temos algo de material e palpável para reflectir e para mudar o que houver a mudar. Julgo que estes diários levam à mudança do eu, do outro, se quisermos de um colectivo de uma equipa.

Enquanto Enfermeiros, quantas vezes, situações surgidas em estágio com alunos nos levaram também a nós a alterar comportamentos? Julgo que muitas. Os diários de aprendizagem são pela autora abordados sempre na perspectiva de crescimento de formando e formador, extrapolando julgo que somos diariamente formandos e formadores.

E em jeito de diário de aprendizagem, por neste momento ter no meu serviço alunos em estágio, e só estar na prestação efectiva de cuidados há 4 meses, após um interregno para funções sindicais de 7 anos, ontem tive necessidade de reflectir com a responsável da formação em serviço algumas atitudes perante o aluno em estágio e os objectivos destes. Apesar de não estar directamente com nenhum, sei que serei um exemplo e ao mesmo tempo serei desafiado. Portanto durante algum tempo reflectimos, após o confronto com a realidade sobre trabalho e métodos de trabalho, pausas, objectivos. Ou seja, sem o ter escrito, também eu tive necessidade de fazer o meu próprio diário de aprendizagem para sobre ele reflectir com alguém e perspectivar formas de estar e agir na prática.

Para a autora a reflexão como processo depende:
- Auto-regulação
- Expectativas de Eficácia
- Confrontação
- Análise critica
- Mudança

“O processo de reflexão é indispensável na caminhada destes estudantes, permitindo-lhes, nos contextos de trabalho, níveis progressivos de desenvolvimento e confrontos, num processo ainda não acabado, conduzindo-os para a autonomia, o desempenho livre e responsável da sua cidadania e actividade profissional” pág. 17

Limitava-me a provocar os colegas e a plagiar a autora transcrevendo a mesma frase substituindo “…destes estudantes …” por “dos enfermeiros”. O resultado seria este:


O processo de reflexão é indispensável na caminhada dos enfermeiros, permitindo-lhes, nos contextos de trabalho, níveis progressivos de desenvolvimento e confrontos, num processo ainda não acabado, conduzindo-os para a autonomia, o desempenho livre e responsável da sua cidadania e actividade profissional.

Sim, porque o nosso desenvolvimento terá que ser dinâmico logo inacabado e a autonomia algo conquistado no dia-a-dia através num processo também ele dinâmico de certificação de competências e de capacidade de tomar decisões reflectidas e justificáveis.


Atenção ao futuro o “conceito de experiência assim, não será a simples passagem do tempo que a constroí…” pág. 14.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

DICOTOMIA ENTRE SABERES E COMPETÊNCIAS


LE BOTERF agrega a competência a um "SABER-MOBILIZAR"
"Possuir conhecimentos ou capacidades não significa ser competente. Podemos conhecer as técnicas ou regras de gestão contabilistica e não saber aplicá-las no momento oportuno. Podemos conhecer o direito comercial e redigir mal contratos.
Todos os dias, a experiência mostra que as pessoas estão na posse de conhecimentos ou de capacidades não sabem mobilizá-los de maneira pertinente e no momento oportuno, numa situação de trabalho. A Actualização daquilo que sabemos num contexto singular (marcado por relações de trabalho, uma cultura institucional, imponderáveis, imposições temporais, recursos...) é reveladora da "passagem" à competência. Esta realiza-se na acção" (Le Boterf, 1994, pág. 16)

AUTOFORMAÇÃO EM CONTEXTO PROFISSIONAL



COUCEIRO, Maria do Loreto Paiva


Maria do Loreto Paiva Couceiro tem o Doutoramento em Ciências de Educação (Dezembro de 2000). Especialidade "Educação e Desenvolvimento" na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT/UNL) e na Universidade François Rabelais, Tours (França). Investigadora da Unidade de Investigação Educação e Desenvolvimento (UIED), da FCT/UNL, sendo coordenadora do Sub-Programa "Autoformação e formação experiencial", desde 2001. Docente no Cursos de Mestrado "Educação e Desenvolvimento" da FCT e colaboradora do Mestrado"Formação de adultos" da FPCE da Universidade de Lisboa, sendo orientadora de dissertações de Mestrado e doutoramento. Foi co-responsável pela concepção, organização e execução do Mestrado "Formação e Desenvolvimento Sustentável", realizado no Brasil, no âmbito de uma Convenção entre a Universidade Nova de Lisboa e a Université François Rabelais de Tours, 2002- 2004. No âmbito da Profissionalização em Serviço foi Orientadora Pedagógica e responsável pelo Módulo "Desenvolvimento Curricular" na FCTUNL.

Texto publicado na Revista Formar, Abril de 1995, Nº 14 – págs. 6 a 15, Lisboa.

A autora dedica este texto à “Autoformação em Contexto Profissional”. Questiona o actual modelo de formação “clássica”, considerando-o limitador da própria formação, por fixar um tempo, um lugar e uma acção/actividade, não se coadunando com a própria evolução do trabalho, que apela a uma renovação contínua de conteúdos, o que deverá implicar uma renovação também contínua das modalidades de formação.

Alterar a forma de “fazer” formação está evidenciada no Livro Branco da Comissão Europeia sobre “Crescimento, Competitividade e Emprego”, em que apela “… a uma formação que seja catalizadora de uma sociedade em mutação.” (pág.7). E esta formação terá como objectivos “… o desenvolvimento das capacidades de evoluir e agir num ambiente complexo, de “aprender a aprender” ao longo de toda a vida, de reconstruir permanentemente conhecimentos e saberes.” (pág. 7). A isto se poderá chamar autoformação.

A autoformação é uma prática colectiva que interliga tudo aquilo que nos rodeia, levando em conta as nossas vivências e os saberes junto dos outros. Implica uma enorme responsabilidade na própria formação.

Autoformação e correntes que a definem quanto à sua finalidade (Galvani):
- A perspectiva técnico-pedagógica (auto instrução) – aquisição de novas técnicas e informações;
- A perspectiva sócio-pedagógica (auto educação) – aprendizagem de metodologias;
- A perspectiva bio-epistemológica (autoformação) – a acção reflexiva do Sujeito, em que “… é a pessoa, na sua globalidade, o objecto da formação.” (pág.9).
Independentemente da finalidade, na autoformação o lugar central é dado à pessoa adulta, desafiada a assumir-se como sujeito do seu processo formativo.

Citando Lerbet (1981) a autora afirma que a autoformação “… trata-se de um sistema vivo que estabelece trocas com o contexto onde se insere.” (pág.10).

Quanto às funções da autoformação, a autora cita Mezirow e Pineau apontando para três aspectos que se intercruzam:
- Instrumental (para agir no meio e nos outros);
- Diagonal (para comunicar);
- Auto-reflexão (para se compreender a si próprio).

O desenvolvimento da Autoformação carece de controlo e Carré evidencia três tipos que estão interrelacionados entre si:
- Pedagógico (métodos, recursos e circunstâncias da formação);
- Psicológico (motivações, necessidades e projectos pessoais);
- Sociopessoal (conscientização).

A personalidade e o percurso de vida de cada pessoa são aspectos fundamentais para a predisposição dos indivíduos se autoformarem.

Para que o processo de autoformação resulte, formando e formador têm que ter em linha de conta:
- Negociação e construção de um projecto;
- A experiência vivida por cada um;
- A reflexão para articular os dois processos anteriores.

Finalmente a autora dá-nos o exemplo de autoformação no seio de uma empresa onde afirma que “Promover uma mão de obra que pensa, reflecte, que é capaz de resolução de problemas e não mera executora, é apostar no potencial humano como recurso fundamental da própria qualidade e desenvolvimento da empresa.”págs. 13 e 14

Refere ainda que devem ser as próprias empresas a fomentar programas tendo em vista a dinamização da autoformação.

Com este texto entendo que a autora coloca em causa o modelo organizacional de muitas instituições no que diz respeito à formação, mas como estamos a falar de autoformação, não “poderemos sacudir a água do nosso capote”, diariamente somos confrontados com situações formativas, que só o são, se perante elas conseguirmos ter uma reflexão crítica, se interrogarmos, se investirmos.A reperspectivação é fundamental depois do acto reflexivo.

Numa fase em que tanto nos queixamos, (ainda que com alguma razão), que perdemos autonomia por decretos-lei, convém lembrar que o percurso evolutivo do reconhecimento social e da verdadeira autonomia prática dos Enfermeiros surgiu por decreto (REPE), mas só após os Enfermeiros a terem feito vingar na prática.

Foi a afirmação autónoma dos Enfermeiros em contextos laborais que nos levou a uma série de evoluções profissionais desde 1975 até 2000 (desenvolvimento impar no panorama sócio-laboral das profissões em Portugal). Como diria Paulo Freire, os enfermeiros afirmaram-se “nos espaços de acção-reflexão”.

Ainda recentemente, numa situação de jejum de um doente para realização de um exame, este solicitou um pouco de água. A resposta mais corrente é não. Contudo a equipa decidiu reflectir….(até porque 30 minutos antes do exame administramos água com líquido de constaste). Para reflectir foi fundamental a pessoa em causa, a sua situação, o serviço, o território da acção. Reunimos saberes, partilhamos experiências, indagamos outros elementos da equipa multidisciplinar e reperspectivamos. Mudámos a prática naquele caso concreto. E como de pequenas coisas se constroem grandes mudanças, os passos continuam a ser dados no sentido da autoformação permanente, assente na reflexão e na grande vontade de continuarmos a ser “flexíveis, capazes de resolver problemas, de decidir e de agir num ambiente complexo” pág. 15.

Enfim, sermos ENFERMEIROS.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

TEORIAS E MODELOS COM APLICAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE


RODRIGUES, Manuel; PEREIRA, Anabela; BARROSO, Teresa

Estes 3 autores são Enfermeiros, e este é um artigo do livro Educação para a Saúde – Formação Pedagógica de Educadores de Saúde, edição da Formasau de 1993.

Este é um texto que continua a abordagem da importância da EDUCAÇÂO PARA A SAÙDE (EPS), como implicação na mudança de estilos de vida. Contudo é um texto mais orientado para teorias e modelos de EPS.

Tentarei ser sintético resumindo o que os extraí do texto como sendo para nós o mais importante:

Teorias:
Teoria da Conscientização, Paulo Freire – Reflecte-se sobre algo em concreto, examinam-se as causas subjacentes, identificam-se implicações e desenha-se um plano de acção.
Teoria dos Estádios de Mudança, DI Clemente – Existe um período de pré contemplação, contemplação, preparação para agir, acção e manutenção.
Teoria da Acção Racional, Fishshbein – Comportamento, intenção, atitudes tudo condicionado por normas.
Teoria do Processamento da Informação do Consumidor – O utente perante determinada informação toma uma decisão racional.
Teoria da Aquisição, Rogers – conhecer, ser receptivo, agir, aplicação de nova conduta, adopção de nova conduta.

Modelos:
Modelo Informativo – Comunicacional – Assente no conhecimento do utente e na informação que lhe é transmitida.
Modelo Humanista – Além de incorporar o modelo anterior, incorpora uma componente bastante forte de valores.
Modelo Neo-Behaviorista – Tudo é assente na aprendizagem da pessoa.
Modelo Informativo – Assente em aulas, na transmissão de conhecimentos sendo unidireccional.
Modelo Persuasivo-Motivacional – Baseado em convencer, realçando crenças e valores e o papel dos reforços
Modelo Politico-Economico-Ecologico – Permite a interacção, as sinergias. È tido em conta o interesse de todos os agentes. A pedagogia é centrada na pessoa e nas suas experiências de vida.
Modelo das Crenças de Saúde – Parte das percepções individuais do que está certo ou errado.
Modelo PRECEDE – identificação do problema, análise das condutas subjacentes e variáveis associadas e intervenção.
Modelo PIDICE – Preparar, Identificar, Desenhar, Mudar, Avaliar

Os autores referem que apesar das variadas teorias e modelos não existem receitas “….não há nenhum modelo que se destaque pela sua supremacia ou certeza absoluta da sua eficácia…”pág. 111.

Na prática a EPS tem de ser bem planeada tendo em conta variados factores nomeadamente o público-alvo da mesma”autoridade do técnico” e “sobrancerismo” pág. 113, são alguns factores que conduzem ao fracasso da sessão de EPS.

Os autores, depois, debruçam-se sobre alguns aspectos técnicos a ter em conta no planeamento e apresentação de uma sessão de formação formal, ou se quisermos de uma EPS, esta é sem dúvida uma lacuna que muitos de nós temos.

Entendo que apesar de o objectivo desta disciplina neste pólo da ESEL “Formação em contextos de trabalho” ser o estimular da reflexão sobre práticas profissionais, também deveria ter entrado um pouco por aqui, pela forma como expomos. Como nos dirigimos a um público-alvo. É frequente ouvirmos os Enfermeiros dizerem que têm ”medo” de falar. Aspectos abordados neste texto são para mim quase um corolário lógico dum processo reflexivo evolutivo (comportamentos de adesão, síntese, proximidade, simulação).

E disto, nos dão conta, os autores na pág. 114 “ Em EPS a estratégia psicológica e pedagógica é determinante para a adesão dos sujeitos ao significado da mensagem. Todo o comportamento humano tem um significado, não existe rejeição gratuita nem motivação sem sentido. Esta complexa realidade que constitui a galáxia dos comportamentos humanos, no que concerne a estilos de vida saudáveis, implica da parte do educador de saúde, uma adequada preparação prévia, um rigoroso trabalho de desenvolvimento de habilidades, capacidades e competências pessoais e sociais.”

Mas acredito que hoje temos maior capacidade para procurar novos recursos tendo em vista a transformação e a mudança objectiva e concreta nas práticas que identificamos como rotineiras e menos correctas.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

SERÁ ?

"... hoje a maior parte dos desgraçados dos alunos, têm de aguentar professores, a quem não pediram coisa nenhuma..."
POFESSOR AGOSTONHO DA SILVA
(ver filmes em posts anteriores)

domingo, 6 de janeiro de 2008

EDUCAR PARA A SAÚDE NO SEX. XXI



RODRIGUES, Manuel; PEREIRA, Anabela; BARROSO, Teresa

Estes 3 autores são Enfermeiros, e este é um artigo do livro Educação para a Saúde – Formação Pedagógica de Educadores de Saúde, edição da Formasau de 1993.

Num prefácio do actual presidente do Conselho de Administração do Hospital da Universidade de Coimbra é-nos referida a vantagem da formação de Profissionais de Saúde para os ganhos em saúde, para os avanços tecnológicos e por sermos nós actores da nossa própria acção.

Informação não é conhecimento e conhecimento sem integração num sistema de saberes não é educação” refere no prefácio pág. 7 o Prof. Fernando Regateiro. Só com formação adequada há mudança de atitudes e comportamentos.

Já no texto os autores começam por de uma forma diferente, definir saúde atribuindo-lhe uma conotação individualizada, sugerindo uma clara mudança de paradigma, chegando a afirmar que cada pessoa tem a sua noção de saúde “ A saúde de cada pessoa depende do seu projecto de vida, do seu sentido de felicidade e da sua forma específica de estar no mundo” pág. 11.

Logo, poder-se-á afirmar que o estado de saúde, qualidade de vida e quantidade de vida estão intimamente ligados às políticas de saúde seguidas - logo de correctas políticas de educação.

Então os autores dão o verdadeiro enfoque à EDUCAÇÂP PARA A SAÚDE (EPS), como um processo que envolve a comunidade na promoção da saúde e prevenção da doença.

A EPS implica uma mudança voluntária, onde o foco são as atitudes e os comportamentos de saúde.

Os autores alertam-nos para os riscos que a mensagem da EPS pode provocar, nem sempre benéficos, e causadores de efeitos múltiplos de consequências imprevisíveis. O que é certo é que ninguém muda de comportamentos por imposição. Existem geralmente 2 factores associados a mudança, a convicção e a noção de que algo é prejudicial.

“Os comportamentos de saúde podem ser vistos como resultado de interacção de factores ecológicos sociais e psicológicos e a sua influência na saúde”, “ este enquadramento exige da parte dos profissionais de saúde, visão de futuro e sentido projectivo, conciliando no decurso da sua acção os factores biológicos e os estilos de vida, mas também os factores relacionados com o ambiente físico, cultural e socioeconómico” pág. 25. Ora aqui está em todo o seu esplendor, o indivíduo, inserido na comunidade, e o Enfermeiro como o principal gestor das necessidades holísticas dos mesmos em saúde.

Os autores começam então a colocar o dedo na ferida quando afirmam que a saúde além de depender de aspectos biológicos, comportamentos e estilos de vida, ambiente e condições de vida depende também dos SISTEMAS DE SAÙDE (destacado meu).

Efectivamente, os autores enumeram uma série de programas e compromissos de saúde do estado Português em que os resultados têm vindo a piorar em vez de melhorarem. Nomeadamente nos grupos sócio económicos mais baixos. Ou seja, constatamos que somos um país cada vez com mais assimetrias, com mais precariedade de emprego, com mais desemprego, como menores salários. Ou seja as políticas sociais influenciam os resultados da EPS. Ainda para mais, e devido aos elevados ritmos laborais os pais também deixaram de ter, em alguns casos, o vital papel de educadores dos seus filhos.

Destaco em jeito de resumo a BRUTALIDADE ARREPIANTE desta frase com a qual me identifico a dieta e o tabaco são menos importantes para a saúde que o lugar em que se vive e como se ganha a vida” pág. 31. Será que os Homens e Mulheres que fazem leis já pensaram nisto?

Destaco ainda a declaração assinada pelo Estado Português, que ficou conhecida como declaração de Jakarta aqui transcrita pelos autores “as pessoas necessitam de ter paz, habitação, educação, Segurança Social, boas relações humanos, alimentação, salário e emprego, justiça social, igualdade de Direitos” pág. 31.. Estes são princípios consagrados na primeira constituição da Republica Portuguesa pós Abril de 1974, mas ainda hoje longe de alcançar. Eternizada numa música sempre actual de Sérgio Godinho.


Os autores citam-nos exemplos de EPS na área do Tabaco, Álcool, Drogas, Comportamentos Alimentares, Sexualidade e Toxicodependências.

Mais uma vez e numa clara alusão à importância da reflexão sobre o que somos e fazemos individual e colectivamente no dia-a-dia, os autores alertam que as grandes mudanças começam a partir de pequenos gestos do nosso dia .

Sobre o êxito da EPS, ela está, segundo os autores, relacionado com a multidisciplinaridade de agentes que se entrecruzam em todo este processo. Sendo, que a dispersão profissional pode trazer alguns prejuízos para o processo quando existem falhas de liderança.

Assim apontam OS ENFERMEIROS como os profissionais com o papel de maior RELEVO em todo o processo de EPS

Contudo educadores para a saúde somos todos: Profissionais de saúde, Professores, Pais, Familiares e até Pares….

Este texto acima de tudo despertou em mim, ou por outra, manteve acordado o “bichinho” da intervenção social, também vital para ganhos em saúde numa sociedade que acredito que possa ser melhor. E que efectivamente ataquemos de frente os grandes problema do país, a pobreza, as assimetrias (vidé discurso do Presidente da República no final do ano de 2007). Só depois da balança social, friso SOCIAL, não económica, estiver equilibrada poderemos com equidade promover saúde e prevenir doença.

Continuo a reflectir para intervir e educar de forma coerente e convicta (para os cépticos utópica) num o país onde a produtividade continua a estar à frente da qualidade….